Atualização da NR-1: Saúde Mental fará parte da Gestão de Risco de Empresas
A partir de agora, o cuidado com a saúde mental e a prevenção de assédio no ambiente de trabalho fazem parte das obrigações das empresas, conforme a Norma Regulamentadora Nº 1 (NR-1), que é a principal norma para o gerenciamento de riscos organizacionais.
Em 30 de julho, a NR-1 foi revisada para incluir a exigência de que as empresas identifiquem e gerenciem os riscos psicossociais em seus ambientes de trabalho. Essa mudança foi decidida em uma reunião da Comissão Tripartite Paritária Permanente, composta por representantes do governo, sindicatos e confederações de empregadores, que discute temas relacionados à segurança e saúde no trabalho.
O que são Normas Regulamentadoras (NRs)?
As Normas Regulamentadoras (NRs) são diretrizes e procedimentos estabelecidos pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) do Brasil para garantir a segurança e a saúde dos trabalhadores.
Elas são baseadas na legislação nacional e em regulamentações internacionais, e todas as empresas que contratam trabalhadores sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) devem segui-las obrigatoriamente.
Atualmente, existem 36 NRs que tratam de diferentes aspectos da segurança e saúde no trabalho, todas disponíveis pelo MTE.
Os principais objetivos das NRs são:
- Orientar empregadores e empregados sobre as precauções necessárias para evitar acidentes de trabalho e doenças ocupacionais;
- Preservar e promover a integridade física dos trabalhadores;
- Estabelecer regulamentações claras sobre segurança e saúde no trabalho;
- Fomentar uma cultura de segurança e saúde dentro das empresas.
Entendendo a NR-1 e seus impactos
Com a atualização, as empresas terão que identificar parâmetros psicossociais nos relatórios de gerenciamento de riscos, que são elaborados periodicamente para atender às exigências de segurança do trabalho.
“Essa atualização é muito importante. As empresas terão que gerir esses ambientes de trabalho para evitar o adoecimento mental dos trabalhadores. O objetivo é evitar sobrecarga de trabalho e promover um ambiente saudável, livre de assédio moral, sexual ou qualquer outra forma de violência contra o trabalhador”, explicou Rogério Araújo, secretário de Inspeção do Trabalho substituto do MTE, em entrevista à Agência Brasil.
As novas diretrizes estão previstas para entrar em vigor nove meses após a publicação da norma. Considerando o tempo necessário para o trâmite e a aprovação interna nas empresas, espera-se que as mudanças sejam implementadas em aproximadamente um ano.
Ligação da NR-1 com a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT)
Essa atualização na NR-1 está alinhada com a recente revisão da Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT). Em 27 de novembro de 2023, a portaria nº 1999 ampliou a lista de doenças que podem ser causadas pelo trabalho.
Agora, são mais de 165 doenças, incluindo COVID-19, distúrbios musculoesqueléticos, vários tipos de câncer, abuso de drogas, tentativas de suicídio e patologias de saúde mental. A lista aumentou de 182 para 347 doenças.
O grupo 5 da LDRT divide-se em duas categorias: riscos para o desenvolvimento de doenças e doenças para identificação, diagnóstico e tratamento. Alguns dos fatores de risco agora incluídos são: Estilo de comando; Acesso à integração e treinamento; Comunicação deficiente; Sobrecarga mental; Clima ruim no ambiente de trabalho; Qualidade das interações; Discriminação; Assédio moral/sexual; Assédio psicológico; Ritmo de trabalho acelerado; Gestão organizacional; Jornada de trabalho.
Eu acredito que esses fatores serão observados com mais rigor, e a NR-1 deve detalhar cada um deles dentro de aproximadamente um ano, se seguir os trâmites legislativos dentro da normalidade. Como bem disse o secretário de Inspeção do Trabalho substituto do MTE, “É tempo mais que suficiente para que as empresas adaptem seus processos, inclusive de gestão de riscos”.
Impacto das doenças relacionadas ao trabalho
Com as novas especificações, fica mais fácil identificar e categorizar diferentes condições de saúde mental e transtornos comportamentais devido ao uso de substâncias. Alguns exemplos que compõe o CID 10 são:
- Episódio depressivo (F32)
- Transtornos ansiosos (F41)
- Estresse grave e transtornos de adaptação (F43)
- Esgotamento (Burnout) (Z73.0)
- Consumo de álcool (F10)
- Sedativos e hipnóticos (F13)
- Outros estimulantes, incluindo cafeína (F15)
O que isso significa na prática?
- Colaboradores diagnosticados com as patologias descritas na portaria poderão ter um ano de estabilidade no emprego após a alta médica.
- Colaboradores diagnosticados com as patologias descritas na portaria poderão ter um ano de estabilidade no emprego após a alta médica.
- Empresas e gestores serão responsáveis pelo cuidado com a cultura e o ambiente de trabalho.
- Colaboradores podem contribuir para uma cultura positiva participando de diálogos sobre saúde mental e bem-estar.
- O ambiente de trabalho inclui aspectos físicos, interpessoais, técnicos e psicológicos.
- Investir em fatores como ergonomia, trabalho em equipe, criatividade e autonomia será visto como prevenção para evitar adoecimentos e afastamentos.
- A cultura de segurança psicológica será cada vez mais necessária para criar um ambiente de trabalho saudável e produtivo.
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Diálogo Diário de Segurança (DDS) como exemplo de protocolo
Um exemplo de como a NR-1 pode impactar o dia a dia das empresas é o Diálogo Diário de Segurança (DDS). O DDS é um encontro rápido, com duração média de 5 a 15 minutos, destinado a orientar a equipe sobre os riscos de suas funções e as práticas que devem ser adotadas para evitá-los.
Embora o DDS não esteja formalmente detalhado em nenhuma norma regulamentadora, ele é uma ferramenta prática para cumprir a exigência de informar os funcionários sobre os riscos no ambiente de trabalho e as medidas preventivas.
O DDS deve ser conduzido por um profissional de segurança do trabalho ou especialista no assunto, junto com a liderança do time. Além de discutir medidas de segurança e prevenção, o DDS pode abordar temas como meio ambiente, higiene, saúde mental, organização, limpeza, rotinas de trabalho e comunicação no ambiente profissional.
O que podemos concluir?
As regulamentações legislativas, como a atualização da NR-1 e a revisão da LDRT, têm um impacto profundo nas operações e finanças das organizações.
Operacionalmente, as empresas precisarão implementar novos protocolos e realizar treinamentos contínuos para garantir a conformidade com as normas. Isso pode incluir a necessidade de profissionais especializados em saúde e segurança do trabalho, além de investimentos em programas de bem-estar e ergonomia.
Financeiramente, embora possa haver um aumento inicial nos custos para adequação às novas regulamentações, os benefícios a longo prazo são significativos.
Empresas que promovem um ambiente de trabalho saudável tendem a ver uma redução nos índices de absenteísmo, menor rotatividade de funcionários e aumento na produtividade. Além disso, a prevenção de doenças relacionadas ao trabalho e o manejo adequado de riscos psicossociais podem diminuir custos com tratamentos de saúde e evitar possíveis ações trabalhistas.
Dados recentes do INSS mostram que houve um aumento de 38% nos afastamentos por transtornos mentais em 2023, com 288.865 benefícios concedidos, comparados aos 209.124 do ano anterior. Esse aumento ressalta a importância de ações preventivas e de um ambiente de trabalho que promova a saúde mental.
Ciente de tudo isso, eu quero lhe provocar a refletir sobre a atual maturidade da sua organização quando o assunto é a saúde e a segurança dos seus colaboradores: Se a regulamentação passasse a valer a partir de hoje, você acredita que estaria mais próximo ou longe das adequações? E a partir deste ponto, qual será o seu próximo passo para evitar prejuízos quando esta regulamentação passar de fato a valer?
Rui Brandão é médico, com experiência em Portugal, Brasil e Estados Unidos da América, e mestre em Administração pela FGV em São Paulo. Hoje é CEO & Co-fundador do Zenklub, plataforma de saúde emocional e desenvolvimento pessoal que oferece conteúdos, profissionais e ferramentas especializadas para mais de 1.5 milhões de pessoas no Brasil.