Álcool: beber socialmente pode me causar problemas?
Muitos de nós utilizamos os variados tipos de bebidas alcoólicas como artigo de socialização e de relaxamento, mas é verdade também que ainda temos as nossas dúvidas sobre os efeitos do álcool sob o nosso corpo, o quanto estamos sendo excessivos e o quanto podemos estar transformando a diversão em vício.
Essas questões podem ser vividas por qualquer um de nós, e seja para nós mesmos ou para aquele amigo ou familiar próximo que apresenta um comportamento irregular diante do álcool. Por isso, vamos abordar aqui tudo que você precisa saber sobre álcool, quando ele se transforma em alcoolismo e veja também as dicas da especialista em bem-estar emocional e psicóloga do Zenklub, Mariana Cançado.
Os 3 degraus do álcool
Para começar, vamos usar a analogia da psicóloga Mariana Cançado para analisar as etapas do álcool e vamos falar sobre: beber socialmente, o consumo de álcool e algumas possíveis consequências do seu uso.
Primeiro degrau: álcool
Vamos pensar na cerveja, licor, vinho, cachaça ou whisky, que são bebidas mais comuns ao paladar social. Se você consome qualquer uma dessas bebidas, então estamos falando de uma pessoa não abstêmia, ou seja, usuária de álcool.
A quantidade de álcool em cada uma dessas bebidas varia, e por isso muda também o tempo de absorção no organismo, que por sua vez, varia entre homens e mulheres, peso corporal, alimentação antes do consumo, hidratação corporal e vários outros fatores. Essa variação implica no começo e o no fim dos efeitos do consumo do álcool.
O álcool é uma droga legalizada e tem capacidade de efeito psicoativo, ou seja, é uma substância que age no corpo, causa efeitos positivos e negativos, e possui a capacidade de levar à dependência, que não acontece do dia para noite, como falamos, varia de pessoa para pessoa.
Vamos observar os termos técnicos utilizados para dividir o consumo de álcool em diferentes padrões:
- Uso Recreativo
- Uso Abusivo
- Uso de risco
- Dependência
Segundo degrau: beber socialmente
Como saber se bebo “socialmente”? Beber socialmente traz algum dano?
Você já deve ter se feito essas perguntas e a resposta é que a forma de consumir bebidas alcoólicas está intimamente ligada à cultura. Em alguns lugares não é problema beber uma taça de vinho ou uma caneca de chopp no horário de almoço. Em outros lugares, o álcool não é bem visto em nenhuma situação. Percebemos então que, socialmente, a forma de beber varia bastante.
Do ponto de vista terapêutico, precisamos definir melhor o que é beber socialmente. A chave está na seguinte pergunta: a forma como você bebe atualmente te traz algum dano ou algum prejuízo? Veja bem, não estou falando de quantidade aqui. Não importa se é só uma cervejinha depois do expediente, ou o engradado inteiro no final de semana, uma dose para abrir o apetite ou garrafas inteiras.
Se você não souber responder, pense nas seguintes situações: Você costuma dirigir depois de beber, independente de já ter provocado ou não acidentes de trânsito? Participa de brigas no bar ou em casa? Costuma se atrasar no dia seguinte para o trabalho? Deixar de tomar medicação prescrita para beber ou apresenta problemas de saúde, como dores no estômago ou problemas hepáticos? Costuma ter quedas ou passa vergonha e não se lembra do que aconteceu no dia anterior? Faz sexo desprotegido – que você não faria normalmente?
Se as suas respostas foram “sim” para alguns desses exemplos ou você tem alguém próximo que se identificaria com essas questões, vamos avançar para o terceiro e último degrau da nossa especialista:
Terceiro degrau: contando os prejuízos
“Mas não sou só eu, todas as pessoas que conheço também bebem assim”. É provável que algumas das pessoas que você conhece ou convive, também tenham a mesma forma de beber que você. Te convido a refletir: se a maioria de uma população estiver com nível de estresse alto, isso quer dizer que o estresse se tornou mais comum, porém não se tornou mais saudável. E ainda, mesmo que eu só conheça pessoas estressadas, isso não quer dizer que pessoas não-estressadas sejam seres inexistentes.
Portanto, você pode estar bebendo – socialmente – sem prejuízos ou com algum prejuízo. Se esse for o caso, você sabe o que fazer?
O profissional psicólogo pode te ajudar a pensar sobre a forma de beber e juntos estabelecer um objetivo terapêutico. Isso quer dizer que necessariamente você vai ter que parar de beber? Não! A meta pode ser estabelecida em conjunto, pesando as vantagens e desvantagens de cada opção.
Por exemplo, diminuir a quantidade consumida, ou diminuir a quantidade de dias em que bebe, ou parar completamente por um tempo e depois voltar a beber, ou parar de beber. A decisão dos objetivos é sua, basta você abrir o jogo e a cabeça para receber as novas oportunidades e ter coragem para colocar em prática.
E quando beber socialmente se transforma em alcoolismo?
Continuando a linha do tempo sobre o tema, vamos aprofundar na questão do vício com o álcool, quando ele se transforma em algo mais grave e como buscar ajuda e superar.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o alcoolismo uma doença caracterizada pela vontade incontrolável de beber, a tolerância maior aos efeitos do álcool, ou seja, você precisa de grandes quantidades para manifestarem os efeitos da bebida, a falta de controle para conseguir parar de fazer o consumo naquele ou em outros momentos e a dependência física, que em situações de abstinência, provocam sintomas físicos e psíquicos.
Segundo a OMS, só no Brasil, 10% da população sofre de alcoolismo, sendo 70% homens e 30% mulheres, e o diagnóstico e a distinção entre casos de alcoolismo e não-alcoolismo, não está na quantidade de álcool ingerido pela pessoa, mas sim a sua capacidade de controlar o consumo.
O que contribui para uma predisposição ao vício do álcool?
Já é reconhecida que a genética interfere sim nos processos de dependência no nosso corpo, mas há outros fatores como ansiedade, depressão, angústia e a insegurança.
Os fatores culturais e sociais que já comentamos aqui, são as portas de entrada para esse universo, que, em geral, se iniciam na adolescência, já que o álcool provoca desinibição.
Quando devo procurar um tratamento ou ajuda?
O primeiro passo é determinado pela própria pessoa, que deve reconhecer em si um alcoolista e ter vontade de mudar a situação. O tratamento varia de acordo com cada necessidade e cada pessoa e envolve o processo de desintoxicação.
O acompanhamento terapêutico pode ser realizado de forma individual e/ou em grupo, como o conhecido grupo Alcoólicos Anônimos (A.A), por exemplo, e há quem faça uso de medicamentos para ajudar a controlar o desejo de beber.
Como funciona o AA?
O AA é uma comunidade de pessoas que compartilham suas experiências com o álcool em busca de um bem comum, que é a recuperação e o controle total sobre o desejo de consumi-lo. Os encontros são periódicos e envolvem reuniões que tem por característica uma compreensão mútua pelos participantes, o que contribui para a recuperação e reafirma o apoio psicológico.
Alcoolismo tem cura?
Apesar de ser uma doença possível de ser tratada e de ser superada por longos períodos, infelizmente, não há cura. Ou seja, o alcoolista pode conseguir ficar sem beber por diferentes períodos, mas as recaídas ainda são uma realidade para essas pessoas. A abstinência é sim suficiente para não reviver novos problemas, mas ela só é conquistada dia após dia.
Como a família pode ajudar?
O alcoolismo é uma doença que interfere não só na vida do alcoolista como também na vida da família e das pessoas do convívio. Nessa etapa de descoberta do vício e durante o tratamento, a compreensão, apoio e coragem das pessoas próximas é uma peça fundamental.
Se você é essa pessoa próxima e sente que também precisa de apoio para entrar nesse ciclo de ajuda, procure a orientação de membros do A.A ou converse com um psicólogo especialista no tema. Afinal de contas, você também precisa estar pronto enfrentar esse desafio.
Outras consequências
Se ainda assim você, que bebe socialmente ou já ultrapassa os seus limites, não se convenceu de que o consumo de álcool em excesso ou a dependência podem ser sim problemas a serem tratados com um especialista, não esqueça de outras complicações na sua saúde que o álcool pode trazer, como: problemas no fígado, pâncreas e intestino, doenças cardiovasculares, redução da imunidade e anemia, osteoporose, prejuízos cerebrais e até mesmo o câncer.
Cuide-se e lembre-se que o seu corpo é sua melhor casa.
Rui Brandão é médico, com experiência em Portugal, Brasil e Estados Unidos da América, e mestre em Administração pela FGV em São Paulo. Hoje é CEO & Co-fundador do Zenklub, plataforma de saúde emocional e desenvolvimento pessoal que oferece conteúdos, profissionais e ferramentas especializadas para mais de 1.5 milhões de pessoas no Brasil.