O que é conarcisismo?

Conarcisismo significa alimentar, sem perceber, o narcisismo do outro. Assim como um codependente que sustenta o vício de um dependente químico, o conarcisista contribui indiretamente para a manutenção dos traços narcisistas do parceiro amoroso.

É comum que uma pessoa codependente tenha comportamentos submissos para agradar e manter a pessoa amada por perto, porque sente muito medo de ficar sozinha.

Por que o narcisismo e conarcisismo se atraem?

Pessoas conarcisistas se encaixam bem com narcisistas, e vice-versa, porque suas personalidades são complementares.

Enquanto os narcisistas necessitam de admiração e prioridade, os conarcisistas estão a postos para fornecer muita atenção e elogios. Narcisistas tendem a buscar a liderança ou controle das situações. Do outro lado, o codependente é habituado a uma postura subserviente ou passiva.

A natureza generosa do conarcisista ajusta-se perfeitamente ao estilo exigente e egoísta do narcisista. O problema é que este tipo de parceria não é mutuamente satisfatória.

O que é narcisismo?

Ter amor próprio e desejar o melhor para si são aspectos saudáveis que existem nas pessoas. Mas quando estas características são exageradas e ferem os direitos dos outros, isto se enquadra no transtorno mental da personalidade narcisista.

O Transtorno de Personalidade Narcisista, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), se refere a alguém que apresente ao menos 5 destas características:

  1. Senso inflado da própria importância e talentos;
  2. Fantasias ilimitadas de sucesso, poder, inteligência, beleza, status, riqueza, inteligência, etc; 
  3. Convicção de ser especial e único;
  4. Exigência de muita atenção, admiração e adulação;
  5. Senso de ter mais direitos;
  6. Exploração dos outros para benefício próprio;
  7. Falta de empatia;
  8. Crença de que é invejado, mas costuma ser invejoso;
  9. Postura arrogante e insolente.

A dinâmica amorosa do narcisista e do conarcisista

Geralmente o relacionamento se molda à personalidade do narcisista, havendo menos espaço para a outra pessoa, causando uma dinâmica amorosa abusiva e tóxica. Com base nos critérios diagnósticos da personalidade narcisista, será analisada de que maneira o conarcisista coopera com o narcisismo do parceiro, mesmo que inconscientemente.

Grandiosidade X Aplausos

O conarcisista poderá enaltecer a importância e os talentos da pessoa amada porque deseja agradá-lo. O problema desta atitude é colaborar para que o narcisista se sinta numa posição elevada não só na vida lá fora, mas dentro do relacionamento também. 

Com isso, o narcisista pode ter a tendência a subestimar a outra pessoa da relação, como modo de garantir o seu papel superior. Através de críticas e invalidações o narcisista vai marcando seu posto de detentor do saber. 

Com o parceiro conarcisista enfraquecido, alimenta-se a idéia do narcisista ser o melhor da dupla e se instala uma relação onde não há equidade, mas uma relação marcada por desigualdade, onde um é forte e o outro é fraco, um é perfeito e o outro imperfeito.

É comum que o narcisista reaja muito mal quando não é colocado no patamar mais alto. Sem perceber, o conarcisista colabora com o senso de grandiosidade do outro para evitar brigas ou retaliação.

Busca por status X Ser útil

O conarcisista tende a assessorar no êxito das realizações ilimitadas do seu par, se colocando numa posição de “secretário” ou “sócio”. Buscando se sentir mais amado, acaba por não perceber que sua permanência na relação, muitas vezes, depende deste “serviço”. Na hipótese do codependente parar de auxiliar na imagem de sucesso do parceiro, ele pode deixar de ser interessante e até ser descartado, pois é comum o narcisista valorizar o cônjuge em termos da utilidade que ele lhe concede e não pelo ser humano que ele é.

Nesta dinâmica, geralmente o casal empenha mais esforços nas aspirações do narcisista, levando o conarcisista a abafar sua identidade e seus planos individuais. Sem espaço para si na relação, sobra-lhe apenas o papel de secretariar o companheiro narcisista. Com o passar do tempo, o conarcisista chega a ficar mais especialista em perceber as necessidades do outro do que as suas, distanciando-se ainda mais do seu “eu”.

Ser especial X Medo de ficar sozinho

Se o conarcisista acredita que o parceiro é extraordinário, pode ser induzido a manter-se junto mesmo com sofrimento, pois pensa que não encontrará outra pessoa tão especial para se relacionar. O narcisista, algumas vezes, reforça isso dizendo que se o envolvimento amoroso acabar, a outra pessoa ficará sozinha para sempre ou terá experiências negativas em romances comuns que existem por aí. Ao incorporar esta ideia, o conarcisista passa a sentir que não pode perder a única fonte de afeto no mundo e aumenta o empenho para o relacionamento não terminar, se curvando ainda mais para agradar.

Necessidade de muita atenção X Sacrifício

No momento que o conarcisista passa a colocar o narcisista em primeiro lugar e fornece toda a atenção exigida, instala-se um funcionamento que não pode mais mudar. Se o narcisista não se sentir atendido ou priorizado, pode ficar furioso, se queixar, ameaçar que vai abandonar, causar ciúme, adoecer ou outras ações que levem a recuperar a atenção plena. O conarcisista pode passar a se dedicar menos a amigos, familiares e a si mesmo, levando-o a um isolamento e a um nível baixo de autocuidado. Pode acontecer do narcisista minar as relações interpessoais do companheiro a fim de garantir exclusividade no olhar. Como os codependentes confundem sacrifício com amor, acabam acreditando que estão cumprindo o papel esperado de um parceiro romântico, mesmo não recebendo a mesma dedicação.

Acreditar ter mais direitos X Lealdade

O perfil apaziguador do codependente contribui para o narcisista extrapolar os limites saudáveis ao saber que será privilegiado, compreendido ou perdoado. O conarcisista pode consentir com abusos na esperança de ser reconhecido, mostrar seu amor inabalável, ou como estratégia para inibir mais hostilidade.

O conarcisista pode chegar a se colocar em situações degradantes e ilícitas quando compactua da idéia do narcisista ser merecedor de mais direitos e ser imune da culpa pelos seus atos. Este ponto é muito delicado porque alguns codependentes não têm a percepção de que estão sendo vítimas de violações ou cúmplices de violações. Um conarcisista pode abafar crimes ou ser coautor em trapaças, concordando que o narcisista deve ser favorecido mesmo em detrimento dos direitos dos outros. 

Explorar os outros X Generosidade

Sob a crença de ser um ato de amor, pode acontecer do conarcisista apoiar que o narcisista sempre se sinta beneficiado e satisfeito, agindo de modo a privilegiar os desejos dele em detrimento dos seus. Pode ceder sexualmente sob coerção, destinar dinheiro ou bens a pedido do narcisista, fornecer informações sigilosas, etc. sem se dar conta de estar sendo alvo de exploração. Ao ser usado recorrentemente, o conarcisista passa a ocupar o lugar de pessoa secundária e sem valor na relação. A fim de alcançar mais importância e afeto, cede cada vez mais às explorações do parceiro, mantendo o ciclo abusivo. O conarcisista, muitas vezes, não consegue sair deste circuito porque fica preso a um padrão de sacrifício em troca de alguma “migalha”. 

Falta de empatia X Passividade

Com o passar do tempo, o conarcisista pode chegar a naturalizar o fato de não ter seus sentimentos e vontades validados pelo cônjuge. Como o narcisista não compreende as emoções alheias, torna-se habitual que apenas os sentimentos, interesses e necessidades do narcisista sejam considerados. Se torna recorrente que o conarcisista desista de expressar o que quer ou sente porque geralmente o parceiro esquece, desvaloriza, adia ou ignora. Ao deixar de se manifestar, sem perceber, está a favorecer a negligência emocional e a falta de consideração.

Inveja X Submissão

Quando o conarcisista não percebe que o parceiro tem tendência à inveja, pode não enxergar que dificilmente recebe apoio para projetos próprios que possam ter destaque. Do mesmo modo, com frequência pode receber críticas ou indiferença a respeito de suas conquistas. E em situações mais graves, o narcisista pode sabotar os planos. Estes são comportamentos do narcisista sob o domínio da inveja, pois ele não consegue lidar com o fato de alguém ser melhor do que ele ou conquistar algo que ele não conseguiu. Mas dificilmente o parceiro narcisista irá perceber isso porque está muito concentrado em acreditar que ele é que é invejado. Se o conarcisista contribui com a idéia de que o parceiro é invejável, fazendo comparações favoráveis, apontando possíveis sinais de inveja por parte dos outros e participando desta dinâmica de cobiça, acentuará esta característica competitiva dele e favorecerá, indiretamente, que a força da inveja recaia também sobre si.

Arrogância X Devoção

Algumas vezes o conarcisista se torna um promotor da imagem pessoal de sucesso do narcisista e, sem se dar conta, coopera para que ambos se distanciem da realidade de que pessoas têm pontos fortes e pontos fracos. Neste movimento relacional, o conarcisista passa a não enxergar os pontos fracos do parceiro, alimentando a dinâmica abusiva em que se encontra por achar que seu par amoroso é “perfeito”. O comportamento continuamente desrespeitoso do narcisista, quando consentido por parte do conarcisista, coloca-o em uma armadilha de ter que aceitar o desdém e o descaso praticado tanto contra os outros, quanto consigo.


Como se pode ver, a personalidade complacente do conarcisista atende perfeitamente ao que o narcisista espera. Mas acatar as vontades alheias com tanta facilidade, distancia o conarcisista de olhar para si próprio e se apropriar da sua vida. Ao mesmo passo, ser egoísta e ofuscar o par amoroso impede que o narcisista enxergue as singularidades e o valor da pessoa que está ao seu lado.

O tratamento psicológico é um passo crucial para a quebra do ciclo insalubre instalado em uma relação romântica entre estes dois perfis. Os casais que reconhecem em si mesmos a presença de traços narcisistas ou conarcisistas podem se beneficiar tanto da psicoterapia individual, quanto da terapia de casal.

Tratar a inclinação à devoção por parte do conarcisista e a busca incessante por elogios e validação por parte do narcisista permitirá que ambos explorem outras posturas e alcancem uma convivência a dois mais equilibrada.

Se você se identificou com este artigo e deseja uma ajuda psicológica especializada, conte comigo, tanto para sessões individuais, quanto para terapia de casal.

Sobre a autora

ANA CAROLINA MAINETTI 

Psicóloga e psicanalista, especialista em Psicologia Clínica, em Terapia de Casal, em Sexualidade e em Neuropsicologia, com experiência no atendimento psicológico online. Desde 2017 atua na plataforma Zenklub, ajudando brasileiros de todas as partes do país e do mundo. CRP: 08/17342

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