Sair da Caixa: “Luto para desnaturalizar o esteriótipo que a sociedade me colocou e contra a necessidade de perfeição em todas as Alines que me proponho a viver enquanto mulher”
Hoje a conversa do Sair da Caixa é com a Aline Lima, uma mulher educadora emocional especializada em Gênero e Diversidade, de 33 anos, nascida em São Bernardo do Campo, em São Paulo, negra, feminista, apaixonada por pessoas e que há 2 anos encontrou em seu melhor amigo, o Junior, um companheiro de jornada e que vem ressignificando o seu lado afetivo.
Conheça essa história e descubra como a Aline superou adversidades como abuso e discriminação e hoje transforma a vida de outras mulheres.
Vamos começar falando sobre a sua extensa lista de formações para chegar onde você chegou como educadora emocional especializada em Gênero e Diversidade.
Sou formada em Direito, com especialização em Marketing e Gestão de Pessoas e Psicologia Organizacional. Trilhei meu caminho profissional e de aprendizagem passando por formações de Inteligência Emocional, Coaching, Análise Comportamental, Programação Neurolinguística, além de diversos treinamentos ligados a Gestão de Pessoas.
Atualmente, continuo buscando novas fontes e estou cursando especialização em Psicologia Analítica Junguiana e em breve um Doutorado Informal em Novas Economias.
No lado profissional, como você aplicou esses conhecimentos?
Iniciei minha vida profissional como Advogada passando por 3 grandes escritórios e tendo a oportunidade de me tornar coordenadora de uma grande equipe aos 24 anos, nesse momento, percebi que era apaixonada por pensar novas formas de fazer as coisas e fui buscar maiores conhecimento no MBA em Marketing.
Aos 27 anos fiz a minha primeira transição de carreira e me tornei Diretora Administrativa de uma fundação sem fins lucrativos que atua na área de Comunicação Audiovisual. Nessa nova área tive o desafio de liderar pessoas e pensar o futuro da organização de uma forma sistêmica o que me convidou a buscar maiores conhecimentos sobre desenvolvimento humano e a importância das relações interpessoais.
Me especializei em Gestão de Pessoas e Psicologia Organizacional, mergulhando profundamente nesse mundo até decidir que faria a minha segunda transição de carreira em dezembro/2017 para atuar no campo do desenvolvimento humano, em especial com as mulheres.
Explica um pouco o seu projeto com as mulheres.
Eu acredito que toda mulher deve ser respeitada por sua história, pelo seu caráter, pela sua essência e por tudo que ela pode contribuir para o mundo enquanto ser humano, o meu sonho é que todas as mulheres possam acessar internamente o seu poder e recursos para promover a mudança que a sociedade precisa.
Também acredito que a nossa sociedade foi pensada por meio de um olhar masculino deixando para trás valores femininos muito importantes e nos fazendo esquecer o que é exatamente ser mulher, aumentando desigualdades sociais e colocando a mulher em uma papel inferiorizado e objetificado.
Passei grande parte da minha vida desconectada com a minha verdade e vivendo de forma estereotipada para seguir uma programação social, mesmo sentindo que nada daquilo me fazia bem. Participante ativa e passiva de episódios de abusos físicos e emocionais, neguei, por muito tempo, a minha feminilidade e quem eu era de verdade e com isso espalhei tristeza, raiva e rancor. Ao chegar no fundo do poço me envolvendo em relacionamentos abusivos, fazendo uso de drogas lícitas e ilícitas, acreditando que nunca seria capaz de ser feliz procurei ajuda emocional e iniciei a minha retomada de poder.
Hoje eu consigo enxergar que tudo o que eu passei foi para que eu pudesse ser a mulher que me tornei e que todo esse caminho foi trilhado buscando a minha melhor versão, mas que nada adianta eu me transformar se eu não for agente de transformação na sociedade.
Assim, por acreditar na necessidade do protagonismo da mulher na busca por mudanças sociais visando a igualdade de gênero, raça e o respeito pela diversidade, eu me dedico a usar todas as ferramentas que eu adquiri para despertar a melhor versão de outras mulheres. Faço isso por meio das minhas redes sociais, palestras, rodas de conversas, consultorias e facilitação de cursos online.
O que te motivou e inspirou a tocar projetos que abraçam as mulheres?
A minha história de vida e a história de vida das mulheres da minha família. Minha mãe nasceu de um estupro, e ainda na infância também foi estuprada, o que deixou marcas muito fortes na sua psique e resultou em muita dor durante toda sua vida. Também fui abusada na infância e tive que desenvolver uma inteligência emocional para lidar com toda essa carga emocional de dor e para poder lidar com as dificuldades de ser mulher na nossa sociedade.
Acredito que tudo o que passei tem que servir para ajudar outras mulheres a não precisarem viver essa dor.
Quais foram as maiores dificuldades que você encontrou na carreira, principalmente, por ser mulher, negra e empreendedora?
Para mim a maior dificuldade foi a objetificação da mulher negra, que acaba trazendo insegurança emocional e baixa autoestima. A sensação que eu tinha era que eu era uma fraude, que seria descoberta a qualquer momento e também que não tinha conhecimento o suficiente para seguir.
Outros aspectos que também me marcaram muito foi não ser validada nas minhas propostas por acreditarem que não eram boas o suficiente e ver outras propostas com menor potencial criativo e intelectual serem consideradas. Tive que me masculinizar e esconder muitas das minhas características para ter espaço e com isso deixei de colocar no mundo inúmeros projetos e ideias, por não acreditar que eles tinham valor.
Quais os principais desafios para as mulheres no mercado de trabalho que você também se identifica?
Para mim o maior desafio da mulher hoje é reconhecer as suas potencialidades, fortalecer a sua autoestima profissional e ainda aprender a lidar com os diversos papéis e a carga mental decorrente disso.
Percebo que ao mesmo tempo que luto para desnaturalizar o esteriótipo que a sociedade me colocou, tenho que lutar contra a necessidade de perfeição em todas as Alines que me proponho a viver enquanto mulher.
A cobrança por estar 100% bem o tempo todo também é um desafio muito grande, pois temos medo de nos vulnerabilizar e deixar de ser reconhecida por ser frágil.
Como você cuida do seu bem-estar emocional hoje, diante de tantas transformações?
Eu faço análise 1 vez por semana, meditação ativa, escuto música clássica para esvaziar a mente, danço como forma de liberar as tensões, uso a técnica do reiki, e quando me percebo muito ansiosa busco a ajuda da minha terapeuta especializada em TCC (Terapia Cognitivo-Comportamental), pois percebo que isso me ajuda a voltar para a realidade e lidar com as questões mais pontuais.
Alguma ideia de quais serão os seus próximos passos?
Estou trabalhando em um Projeto de Sororidade por meio da escuta. A ideia central é utilizar a internet para unir e fortalecer a lutar pela igualdade de gênero e diversidade.
O projeto está em fase de prototipagem, mas tem me deixando muito animada com os resultados que pode trazer para a sociedade.
Qual dica você daria para outras mulheres que desejam alcançar um propósito e o sucesso diante de tantos obstáculos?
A minha dica é: Se respeite e não seja dura demais com você mesma! Isso inclui, respeitar a sua história de vida, o seu tempo, o seu lugar de fala e de outras pessoas, buscar o seu espaço, não se cobrar em ser perfeita, não se comparar com outras mulheres e, principalmente, ser sua verdadeira amiga.